Carta para o avô:

Amado avô.

Sinceramente não sei o que dizer. Partis-te. Simplesmente partis-te. Deus tirou-te dos meus braços. Foste arrastado com a força da morte. Exacto.

Era demasiado cedo. Demasiado cedo. Ainda precisava de mais uns anos contigo. Aliás, depois de tanto tempo, preferia que nunca falecesses. Ficasses eternamente ao meu lado. A embalar-me com as tuas cantigas.

Queria que me contasses histórias da tua infância, e que me relembrasses com aquela tua voz autoritária e grossa, de como sofreste nos teus tempos. De como eras bonito quando criança.

Tenho saudades dos tempos em que um simples abraço teu limpava as minhas lágrimas e me fazia feliz. Tenho saudades dos tempos em que éramos uma família unida e que nada está estilhaçado como agora. Tenho saudades de ouvir a tua voz. Tenho saudades de deitar a cabeça no teu colo e dormir longas horas. Tenho saudades dos teus beijos de boa noite. Tenho saudade dos nossos jantares. Tenho saudades de quando me levavas às cavalitas quando ninguém o conseguia fazer. Tenho saudades de quando me levavas açúcar á boca, e vias comigo desenhos animados naquela televisão antiga e poeirenta.

Queria que visses quem sou. Quanto mais madura agora estou. Queria que visses o quanto mudei. Que já não sou aquela rapariga pequena que em tempos seguravas. Queria que visses que já tiro boas notas. Queria que te orgulhasses de mim. Queria, simplesmente queria que voltasses a ser o meu avô.  

Penso que já parei de chorar. Viste? Parei de tremer. Estou cada vez melhor. Recupero forças e sigo em frente. Normalmente é isto que faço. Mas és diferente. Eras o meu melhor amigo. Eras a minha força. Quero que voltes, porque sem ti, perco esperanças todos os dias. Quero voltar para casa e encontrar-te de novo. Foste embora com a brisa que sopra forte lá fora. Foste embora, deixaste-nos sem reforços para qualquer acção.

Olho agora para esta fotografia estilhaçada e sinto tristeza, noto o teu sorriso e os teus braços a cobrirem os meus antes pequenos ombros.

Tenho saudades.